HAVIA UM JARDIM

AMADOS....



Nós concluímos o encontro anterior com a oração de Jesus em favor da unidade de todas as pessoas que o seguem. Esta oração nos impulsiona a vivermos a unidade: “Pai, que todos sejam UM...”. Pela causa da fraternidade e da vida, Jesus se entrega totalmente e vai enfrentar o sistema que provoca exclusão e morte. É o que vamos ver no encontro de hoje. Antes de prosseguir, vamos ler, com atenção, os capítulos 18 e 19 de nosso evangelho de João. Aí encontramos a narrativa da prisão, julgamento, condenação, paixão, morte e sepultamento de Jesus.



TUDO COMEÇA NUM JARDIM (18,1)



Tudo começa num jardim e vai terminar também num jardim, onde Jesus vai ser crucificado. É o símbolo da vida bela e abundante. Faz lembrar o “jardim do éden”, fruto da bondade de Deus-Criador narrado no livro do Gênesis. Neste jardim Deus colocara o homem e a mulher (Adão e Eva). A humanidade fora expulsa deste jardim porque escolhera o caminho da maldade, fruto do poder e da ambição. Um dos símbolos do poder e da ambição é a cidade de Jerusalém. Desde a criação da Monarquia, na época de Salomão, esta cidade é o centro onde se planejam a dominação sobre o povo. Aí foram construídos o palácio e o templo. Jesus se afasta de Jerusalém e vai até onde se encontra um jardim. Esta saída representa um novo êxodo: do lugar da escravidão e da morte para o espaço da liberdade e da vida.



Portanto, ao lembrar da imagem do jardim, nós queremos mostrar que Jesus vai vencer a maldade e vai resgatar a vida. O templo de Jerusalém era chamado de “o Lugar” onde Deus morava. Jesus rompe com este “lugar” e indica o caminho da verdadeira morada de Deus: a comunidade de amor.



QUEM VOCÊS PROCURAM? (18,2-9)



Toda opção tem um preço. Romper com o sistema oficial e abrir caminhos de liberdade e vida significa atrair a perseguição dos dominantes. Eles tem a colaboração de Judas que, apesar de conviver com Jesus, não conseguiu dar o passo e entrar no seu Projeto de Vida para todos. Judas optou pelo egoísmo e vai entregar o próprio Mestre. Ele conhece o “lugar” onde está Jesus e entra como “ladrão e assaltante”, conduzindo os soldados e alguns guardas dos chefes dos sacerdotes e fariseus.



A pergunta de Jesus: “Quem é que vocês estão procurando” é a mesma dirigida aos dois primeiros discípulos (1,38). Indica a pergunta essencial que toda pessoa humana deve fazer a si mesma.



Jesus responde: “Sou eu”. Faz lembrar a resposta dada por Deus a Moisés quando este pergunta por seu nome. “Sou eu” é o mesmo que dizer “Javé”. É o Deus que vê, ouve e conhece os sofrimentos do seu povo. É o Deus que desce para libertá-lo da escravidão. Jesus, por sua vida, paixão, morte e ressurreição é o novo caminho da libertação de tudo o que oprime a pessoa.



A ORELHA DE MALCO (18,10-11)



Pedro, com seu gesto, aparentemente corajoso, mostra queainda não entendeu quem é Jesus. Em sua cabeça ainda está a idéia de que o Messias vai organizar um sistema de domínio à moda dos impérios deste mundo. A atitude de Pedro é a de um “soldado” disposto a usar da violência para defender os interesses pessoais ou do grupo. Ele decepa a orelha direita de “Malco”. Jesus desaprova a atitude de Pedro.



Porém, há um sentido simbólico que nós queremos ressaltar. A palavra “Malco” significa “rei”. Este nome não se encontra nos outros evangelhos. Em Lucas se diz que ele era “empregado do sumo-sacerdote”. E, ao contrário do evangelho de Lucas, em João nós não dizemos que Jesus curou a orelha de Malco, pois ele representa o sistema sacerdotal que matou a Jesus. É só ler Êxodo 29,20: Aarão e os seus filhos recebem o sacerdócio através da unção da orelha direita com sangue de carneiro. Ao deixar a orelha cortada, simbolicamente, estamos dizendo que a instituição sacerdotal do templo deve ser superada, pois ela virou um poder de morte.



O PODER RELIGIOSO (18,12-27)



Jesus é preso e conduzido às autoridades religiosas. O Sinédrio é o poder máximo composto por 71 homens judeus. É instância de decisão sobre a vida das pessoas no mundo judaico. O sumo-sacerdote é a maior autoridade do Sinédrio. Exerce o cargo fazendo o jogo de interesses do Império Romano para manter o poder do Templo e usufruir toda espécie de benefícios. É ele quem havia dito: “É necessário um só homem morrer pelo povo...”. Para ele, é normal a condenação e a morte de alguém para salvar a “ordem social”. É ele quem interroga a Jesus a respeito dos seus discípulos e da sua doutrina. Procura algo para incriminá-lo, mas não encontra...



Pedro e o discípulo amado seguem a Jesus. Pedro, porém, nega pertencer ao grupo dos discípulos. Ele tem dificuldades de vencer o medo e comprometer-se com a causa de Jesus. É difícil desvencilhar-se do sistema injusto. Ele se “aquece” junto aos empregados e guardas do Sinédrio... E, por três vezes, vai negar que conhece a Jesus. E o galo cantou... Na visão da época, julgava-se que o galo, porque cantava à noite, tivesse parceria com o demônio (o poder das trevas). Portanto, estamos ligando as negações de Pedro, com a adesão ao sistema demoníaco dos poderosos deste mundo.



O PODER POLÍTICO (18,28-40)



Do poder religioso, representado por Caifás, Jesus é levado ao poder político, representado por Pilatos. Este não encontra mal nenhum para incriminar a Jesus. O pessoal ligado ao Sinédrio, porém, insiste que ele é um “malfeitor”. Precisam da aprovação do governador Pilatos para executar a sentença de morte. Querem executá-lo conforme a pena capital dos romanos que é a crucificação. A pena capital dos judeus é o apedrejamento.



Recomeça novo interrogatório. O conteúdo gira em torno da “realeza” de Jesus. O Reino de Jesus, porém, não tem nada a ver com os reinos deste mundo. As pessoas que acreditam nele, devem ter consciência que segui-lo significa aderir à atitude radical de amor-serviço. O gesto do lava-pés é o modelo deste seguimento. Pilatos jamais poderia entender esta “verdade” totalmente desconcertante para os padrões de poder e governo oficiais.



Pilatos não consegue cavar um motivo sequer para condenar a Jesus. Aproveita a ocasião da Páscoa e propõe uma alternativa para salvar a Jesus. Apresenta, como de costume, um preso - Barrabás - para ser condenado. Porém, as autoridades religiosas estão com o coração endurecido: condenam o inocente Jesus e libertam a Barrabás.



Deus nunca está a favor da morte de ninguém. Porém, nós sabemos que, por conveniência, os que dominam não hesitam em aniquilar a vida de quem representa ameaça aos seus privilégios. E Pilatos permite as sessões de tortura.



EIS O HOMEM (19,1-16)



Jesus é flagelado, coroado de espinhos e é vestido com um manto vermelho. E caçoavam dele dizendo em meio a bofetadas: “salve, rei dos judeus”. O corpo de Jesus, sempre a serviço da vida, é aqui ultrajado e aviltado ao extremo. O “corpo de Jesus” são nossas comunidades que, mesmo perseguidas, não podem abdicar da grande missão de defender e promover a vida como o nosso Mestre Jesus. E tantas vezes esta missão exige de nós posicionamento corajoso contra sistemas de exclusão. E as conseqüências não tardam em aparecer.



Pilatos realiza novas tentativas para salvar a Jesus. Apresenta-o sarcasticamente vestido como “rei”, dizendo: “Eis o homem”. Está aí o “Filho do Homem” totalmente despido de qualquer força ou poder. É a imagem do “servo sofredor” do profeta Isaías: “já não parece mais gente, perdeu toda a sua aparência humana...” (Is 53,13-15).



Pilatos, apesar de convencido da inocência de Jesus cede à pressão daquele grupo que pede pela sua crucificação. Não é o povo que pede a morte dele: são as lideranças religiosas. O motivo que alegam é este: “Nós temos uma lei, e segundo a lei ele deve morrer, porque se fez Filho de Deus”. Esqueceram do princípio central de toda a lei que é “não matar”. Na verdade, o legalismo leva à cegueira e acaba com o amor. E, sem amor, as relações sociais tornam-se caminho de morte. E Jesus vai ser crucificado.



A CRUZ (19,16-24)



Impuseram a Jesus uma cruz que vai carregar sozinho até o “lugar da caveira” ou “gólgota”. Aí o crucificaram no meio de dois homens. Nós não dizemos que estes dois homens eram “ladrões”, “bandidos” ou “criminosos”. Acontece que muita gente inocente era condenada, assim como fizeram com Jesus. Aqueles dois “homens”, assassinados com Jesus, são vítimas do sistema que explora e exclui os pequenos. Daí decorrem os descontentamentos e violências. Na verdade, os verdadeiros criminosos são os que geram estruturas sociais, políticas e religiosas que satisfazem apenas aos interesses de pequenos grupos. São estes os verdadeiros “ladrões” da vida do povo. A morte de Jesus e dos dois “ homens” é provocada por esta gente que não aceita assumir a própria verdade e procura mentir e enganar o tempo todo...



Na cruz foi colocada a inscrição: “Jesus Nazareno, o rei dos judeus”, em três línguas: hebraico, latim e grego. Queremos, com isto, mostrar o motivo político pelo qual foi condenado Jesus. As três línguas expressam nossa fé em Jesus como rei universal. É o único digno de ser seguido.



A túnica de Jesus, sorteada sem ser dividida, revela a utopia de nossa “ comunidade de iguais”: o Reino de Jesus, reino de amor e serviço, não pode sofrer divisões.



DE VOLTA AO JARDIM (19,25-42)



Aos pés da cruz permanecem de pé a mãe dele e mais duas mulheres: Maria, mulher de Cléofas, e Maria Madalena. Está presente também o discípulo amado que vai acolher Maria, a mãe de Jesus, em sua casa. O “discípulo amado” representa a nossa comunidade de João que deve ser o espaço da acolhida, da ternura, do consolo e da paz. Queremos ser o novo povo de Deus nascido do sangue que jorra do lado aberto de Jesus. Ele doa livremente a sua vida – o seu espírito - para que todos nós tenhamos a vida em abundância. Eis porque o corpo de Jesus, com o carinho de dois amigos, é ungido e sepultado num lugar onde havia um jardim, símbolo da vida envolta em beleza e alegria. A semente que morre vai explodir em árvore e produzir muitos frutos...



                                                                                                                                   Pr: Delmir Monteiro



PARA CONVERSAR:



1.º “Quem é que vocês estão procurando?” Que significado tem esta pergunta para a nossa vida?



2.º Jesus foi crucificado no meio de duas vítimas de um sistema injusto. Quem são estas pessoas hoje?



3.º O relato da paixão e morte de Jesus inicia e termina num “jardim”. Que mensagem podemos tirar daí?



4.º O que mais nos chamou a atenção no encontro de hoje?







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